eu estava sentado, bambaleando o lápis entre os dedos.
lá em 2011, na cadeira da aula de escrita criativa, o professor nos avisou que criaríamos 1 texto por semana.
se não me engano, no semestre redigi uns 15 textos, dois foram publicados como crônicas em jornais locais.
desses dois, só me lembro claramente do conteúdo de 1 texto.
mas lembro muito bem dos 3 textos que entreguei atrasado.
foram neles que depositei:
a ansiedade dos dias que antecederam a entrega;
os pequenos delírios matinais de quem virou a noite para escrever;
a decepção com o resultado, acumulada na decepção com o processo.
o coração batia em um ritmo e a pálpebra pulsava no dobro.
os dias que antecederam a entrega desses 3 textos foram terríveis.
sinta-se livre para me chamar de sensível, mas senti como término de um relacionamento que prometia muito e entregou pouco.
foi uma carga emocional desmedida. naquela época não sabia pedir ajuda, muito menos o que significava uma terapia.
só lembro de ficar muito irritado comigo por falhar com a data, por ter perdido tempo tentando e não ver o resultado.
eu não queria criar se eu fosse sofrer esse tanto.
eu queria criar.
com toda vergonha do mundo, falei para o professor:
não vou conseguir fazer todos os textos.
ele me recomendou ter um “diário do escritor”.
o escritor era eu. a regra, simples:
anotar o que me chama atenção no dia e observar com calma esses eventos:
podia ser uma fofoca ouvida em um ônibus no trânsito para a casa;
a luz do sol poente que registra a passagem do dia;
como o choro se tornava calma para a criança no colo da vó.
os textos estavam espalhados pelo mundo.
cada observação anotada era uma possível boa ideia.
nem o papel e nem eu estávamos em branco, porque havia interesse em conhecer e se aprofundar no que eu ia escrever.
parecia uma forma melhor de lidar com a criação.
eu não precisava mais escrever um texto do nada.
eu precisava escrever um texto com tudo que coletei. e isso me direcionava.
o botão que eu ligo antes de criar é a curiosidade
é permitir que minhas certezas pesem menos do que minhas observações e emoções sobre o mundo.
se eu quero me comunicar e mobilizar o outro com o que eu crio, no mínimo, preciso me interessar pelo mundo do outro.
o outro escolhe diferentes palavras para comunicar o que sente, tem outras urgências.
em época de inteligência artificial o interesse genuíno e a curiosidade são diferenciais.
porque escrever não começa na página em branco. começa no mundo.
é claro que existem vários tipos de estímulos para a criatividade.
mas sem dúvida, se botar no mundo é uma delas.
com carinho,
lucas morello
do bota na rua
Eu estava precisando deste texto. Muito obrigada. <3
Uma dica valiosa Lucas, não precisamos brigar com a página em branco e o cursor piscando. Obrigado por compartilhar